Reduções expressivas, reestruturação metodológica e maior alinhamento com padrões internacionais marcam a nova versão dos ESRS apresentada em julho.
Por Bárbara Virgili da Costa e Carolina Blois, consultoras em sustentabilidade na Report
Em maio de 2025, a Comissão Europeia emitiu à EFRAG um mandato oficial para revisar e simplificar os European Sustainability Reporting Standards (ESRS). A solicitação partiu do reconhecimento de que as normas, ainda que robustas, exigem ajustes para refletir a diversidade de maturidade das empresas frente à agenda de sustentabilidade.
Desde então, uma série de reuniões técnicas e públicas culminou na versão 1.6 dos Draft Amended ESRS, apresentada ao longo de julho. O Grupo Report acompanhou de perto esse processo e resume, a seguir, os principais destaques.
Cinco eixos da proposta de revisão
A proposta de simplificação estrutura-se em torno de seis frentes principais:
- Simplificação da avaliação de dupla materialidade (DMA);
- Maior legibilidade e concisão das declarações de sustentabilidade, com melhor integração ao relatório corporativo;
- Revisão crítica da relação entre os Requisitos Mínimos de Divulgação (MDRs, agora GDRs) e os tópicos temáticos;
- Melhoria da clareza e acessibilidade do texto normativo;
- Introdução de medidas de alívio para redução da carga de reporte;
Maior interoperabilidade com frameworks internacionais, como o ISSB.
Quais reduções já foram feitas?
As mudanças anunciadas até aqui já representam um corte relevante nos requisitos de reporte:
- 58% de redução nos data points obrigatórios (“shall”)
- 97% de redução nos voluntários (“may”)
- 26% dos MDRs (agora GDRs) eliminados
A proposta não apenas alivia a carga de trabalho das empresas, mas reafirma a lógica de proporcionalidade e materialidade: o foco deve estar no que realmente importa.
Normas gerais (ESRS 1 e ESRS 2): estrutura, materialidade e flexibilidade
ESRS 1 – Requisitos gerais
As mudanças estruturais no ESRS 1 fortalecem a aplicabilidade prática:
- Os comandos “shall” agora são apresentados como data points separados;
- As orientações obrigatórias passam a integrar diretamente os itens de divulgação (como os Application Requirements);
- Os conteúdos não obrigatórios foram transferidos para guias ilustrativos (NMIGs-Non-Mandatory Illustrative Guidance);
- Introdução do conceito “gross versus net”, que diferencia impactos brutos e líquidos na avaliação de materialidade;
- Substituição do termo “matter” por “topic” ou “subtopic”.
De forma geral, as empresas passam a contar com mais autonomia para definir o nível de reporte, de acordo com seu contexto e maturidade, bem como uma cobertura proporcional da cadeia de valor e definições mais claras sobre as fronteiras de reporte.
Dupla materialidade e fair presentation
- A nova seção “considerações práticas” reforça a aplicação proporcional da dupla materialidade;
- A materialidade da informação é reconhecida como filtro central da declaração de sustentabilidade;
- O conceito de fair presentation (apresentação fiel), oriundo do ISSB, passa a ser incorporado, com foco em relevância e representação verdadeira — tema que gerou debate quanto à maturidade das empresas europeias para aplicá-lo com o mesmo rigor dos relatórios financeiros.
- O conceito de fair presentation (apresentação fiel), oriundo do ISSB, passa a ser incorporado, com foco em relevância e representação verdadeira — tema que gerou debate quanto à maturidade das empresas europeias para aplicá-lo com o mesmo rigor dos relatórios financeiros.
ESRS 2 – Governança, estratégia e modelo de negócios
- GOV-4 (antigo GOV-5): reduz a granularidade dos relatos narrativos e reforça a compatibilidade com o IFRS S1/S2;
- SBM-3: duas opções foram apresentadas e serão decididas na consulta pública:
- Dados financeiros quantitativos obrigatórios, com possibilidade de justificativa e uso de qualitativos;
- Informações qualitativas obrigatórias e quantitativas opcionais.
- A nova seção “considerações práticas” reforça a aplicação proporcional da dupla materialidade;
- A materialidade da informação é reconhecida como filtro central da declaração de sustentabilidade;
- O conceito de fair presentation (apresentação fiel), oriundo do ISSB, passa a ser incorporado, com foco em relevância e representação verdadeira — tema que gerou debate quanto à maturidade das empresas europeias para aplicá-lo com o mesmo rigor dos relatórios financeiros.
- O conceito de fair presentation (apresentação fiel), oriundo do ISSB, passa a ser incorporado, com foco em relevância e representação verdadeira — tema que gerou debate quanto à maturidade das empresas europeias para aplicá-lo com o mesmo rigor dos relatórios financeiros.
ESRS 2 – Governança, estratégia e modelo de negócios
- GOV-4 (antigo GOV-5): reduz a granularidade dos relatos narrativos e reforça a compatibilidade com o IFRS S1/S2;
- SBM-3: duas opções foram apresentadas e serão decididas na consulta pública:
- Dados financeiros quantitativos obrigatórios, com possibilidade de justificativa e uso de qualitativos;
- Informações qualitativas obrigatórias e quantitativas opcionais.
GDRs substituem MDRs
Os novos GDRs só são exigidos se a empresa tiver políticas, metas ou ações sobre o tema — uma mudança importante que respeita o princípio da aderência à realidade.
Normas ambientais (ESRS E1 a E5): cortes, clareza e convergência
A reunião de 16/07 marcou a apresentação oficial das propostas de simplificação para os padrões ambientais. Abaixo, os principais pontos:
Objetivos da revisão ambiental:
- Redução de requisitos narrativos e métricos em IRO-1, SBM-3 e PATs;
- Clareza nos indicadores quantitativos (nível 4);
- Eliminação de redundâncias e aumento da compatibilidade com IFRS.
ESRS E1 – Mudança Climática
Item | Ajuste |
E1-1 (Plano de Transição) | Condensação narrativa e foco em compatibilidade com o cenário de 1,5°C |
E1-2 (Riscos Climáticos) | Incorporação do IRO-1 com categorização temporal simplificada |
E1-3 (Resiliência) | Alinhamento com IFRS S2 e destaque para avaliação quantitativa |
E1-4 e E1-5 (Políticas e Ações) | Evita sobreposição com ESRS 2; adaptação climática realocada |
E1-6 (Metas) | Retira a exigência de “net zero”; amplia flexibilidade para metas por intensidade |
E1-7 (Energia) | Elimina intensidade energética por receita líquida |
E1-8 (Emissões GEE) | Intensidade torna-se voluntária; escopos 1, 2 e 3 permanecem obrigatórios |
E1-9 (Créditos de Carbono) | Exige detalhamento, mas sem vínculo com metas net zero |
E1-10 (Preço Interno de Carbono) | Informações mínimas sobre uso e definição do preço |
E1-11 (Impactos Financeiros) | Redução da complexidade narrativa |
Reduções no E1:
“Shall”: -53% (84 de 196)
“May”: -87% (13 de 15)
ESRS E2 – Poluição
- Eliminação do IRO-1 e do E2-6;
- E2-4 passa a exigir relato sobre microplásticos e emissões atmosféricas sem depender do E-PRTR;
- Discussões importantes sobre:
- A ambiguidade no parágrafo AR 4.16(a), que trata de poluentes na cadeia de valor;
- A ausência de uma lista exemplificativa de poluentes reportáveis;
- E2-5 diferencia fabricantes de químicos e usuários finais, com base no regulamento REACH.
ESRS E3 – Água
- Restrição a água doce (recursos marinhos fora do escopo direto);
- E3-4 torna obrigatória a caracterização do balanço hídrico em áreas críticas (de “may” para “shall”);
- Debate aberto: o balanço hídrico deve incluir a cadeia de valor?
ESRS E4 – Biodiversidade e Ecossistemas
- E4-1 exige plano de transição em conformidade com o Kunming-Montreal Global Biodiversity Framework;
- E4-5 solicita identificação apenas dos sites mais relevantes, dispensando relato universal.
ESRS E5 – Recursos e Economia Circular
- E5-4 introduz os “materiais-chave” e faz referência ao Critical Raw Material Act;
- E5-5 flexibiliza métricas de reciclabilidade e descarte, com destaque para reuso e segmentação por tipo de resíduo.
Reduções entre E2 e E5:
“Shall”: -67% (89 de 170)
“May”: -100%
Normas sociais (S1 a S4) e governança (G1): foco em princípios e coerência
A simplificação dos padrões sociais reflete um movimento mais profundo: redução de volume, eliminação de repetições e adoção de abordagens baseadas em princípios.
Diretrizes gerais da revisão social
- Redução da complexidade da avaliação de dupla materialidade
- Convergência com o relatório corporativo
- Reavaliação crítica dos requisitos mínimos
- Clareza textual
- Dispensas com base em ônus excessivo
Padrão | Total original | Deletados | Redução |
S1 – Força de trabalho própria | 127 | 50 | 58% |
S2 – Trabalhadores da cadeia de valor | 47 | 23 | 64% |
S3 – Comunidades afetadas | 45 | 23 | 67% |
S4 – Consumidores e usuários finais | 44 | 22 | 67% |
Além disso, os textos foram reduzidos em até 75% e o número de páginas caiu até 73%.
Destaques por norma
S1 – Força de trabalho própria
- Fusão de sessões repetitivas sobre políticas, ações e metas;
- Exclusão de dados sobre trabalhadores indiretos;
- Foco em engajamento e canais de denúncia (DR2 + DR3);
- Limitação de métricas de segurança aos empregados;
- Exclusão de dados sobre diversidade etária, equilíbrio vida-trabalho, etc.;
- Redefinição de “emprego significativo”: 10 principais países ou 10% da força total.
- Fusão de sessões repetitivas sobre políticas, ações e metas;
S2 a S4 – Terceirizados, comunidades e consumidores
- Remoção de métricas padronizadas, salvo uma exigência do SFDR;
- Substituição por diretrizes baseadas em princípios;
- Incentivo à elaboração de materiais complementares (guidance);
- Destaques:
- Remoção de métricas padronizadas, salvo uma exigência do SFDR;
- S2: saúde e diversidade entre terceiros
- S3: direitos e meios de vida em comunidades locais
- S4: respeito ao consumidor e marketing ético
- S2: saúde e diversidade entre terceiros
G1 – Conduta empresarial
- Adoção formal da estrutura PAT (Políticas, Ações, Metas);
- Determinação de que, quando apenas um subtema for considerado material para a organização, o relatório deve abranger exclusivamente esse subtema, evitando a produção de informações desnecessárias ou irrelevantes ;
- Exclusão de pontos voluntários sobre gastos com lobby;
Manutenção das exigências do SFDR: combate à corrupção, proteção a denunciantes, adesão à ONU.
Integração entre relatórios: EFRAG e IASB avançam no diálogo
A reunião de 17/07 tratou da integração entre relato financeiro e sustentabilidade. A discussão reuniu o Financial Reporting Board (FRB) e o FR TEG da EFRAG, com foco em:
- Dificuldades por setor (varejo, aviação, saúde);
- Conflitos entre modelos contábeis e métricas de sustentabilidade (ex: ativos físicos e escopos de emissão);
- Preparação para contribuição ao Request for Information da IASB, no segundo semestre.
Um ponto-chave: dados compartilhados entre o IFRS 16 e os ESRS precisam ser compatíveis, sobretudo no tratamento de ativos arrendados.
Cronograma: o que vem pela frente
A reunião de 17/07 tratou da integração entre relato financeiro e sustentabilidade. A discussão reuniu o Financial Reporting Board (FRB) e o FR TEG da EFRAG, com foco em:
- Dificuldades por setor (varejo, aviação, saúde);
- Conflitos entre modelos contábeis e métricas de sustentabilidade (ex: ativos físicos e escopos de emissão);
- Preparação para contribuição ao Request for Information da IASB, no segundo semestre.
Um ponto-chave: dados compartilhados entre o IFRS 16 e os ESRS precisam ser compatíveis, sobretudo no tratamento de ativos arrendados.
O que isso significa para as empresas?
A proposta de simplificação sinaliza uma nova fase para os relatórios de sustentabilidade: mais estratégica, menos burocracia. Com foco em materialidade, interoperabilidade e integração com os relatórios financeiros, os ESRS caminham para se tornar um instrumento cada vez mais útil à tomada de decisão — das empresas, dos investidores e da sociedade.
Consulta pública
A proposta está agora em fase de consulta pública, aberta entre 31 de julho e 29 de setembro de 2025. A EFRAG convida todos os interessados — empresas, auditores, investidores, sociedade civil e autoridades reguladoras — a revisar os rascunhos revisados e enviar suas contribuições por meio do formulário oficial. Para ampliar o debate, serão promovidos eventos de divulgação em setembro e outubro, com o objetivo de coletar percepções adicionais antes da entrega do parecer técnico final à Comissão Europeia, prevista para 30 de novembro. Os documentos da consulta estão disponíveis neste link.