IFRS

Normas de sustentabilidade IFRS: mudanças à vista no relato ESG

Hoje, toda empresa que decide publicar seus resultados sabe que um bom relatório é feito com base em metodologias. Nascidos como peças de divulgação, os documentos evoluíram e se profissionalizaram; viraram material de consulta de investidores e servem para atestar a solidez e a consistência da estratégia de uma organização. Se, no eixo financeiro, isso já é ponto consolidado com a adoção global das normas IFRS, no campo da sustentabilidade os desafios são muitos. Excesso de diretrizes, olhar generalista e uma baixa conexão com os negócios são alguns deles – mas uma transformação é prometida com a publicação, ainda em 2023, das normas de divulgação de sustentabilidade do International Sustainability Standards Board (ISSB), intituladas IFRS S1 e S2. Capitaneadas pela IFRS Foundation, a mesma entidade que lidera globalmente o movimento do Relato Integrado (<IR>), as normas vão completar a caixa de ferramentas do relato ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês) (confira aqui um estudo recente do grupo report sobre o tema). Hoje, normas como a da Global Reporting Initiative(GRI) são adotadas por quatro em cada cinco das 250 maiores companhias do planeta. Oferecem pistas para mapear impactos e divulgar, em relatórios, indicadores comuns a diversos setores e tipos de organizações. Falta, porém, a ênfase no aspecto financeiro e no olhar “de fora para dentro” – ou seja, entender como o negócio, além de afetar, é tambémafetado pelos desafios sociais e ambientais de nosso tempo. Quem aderir às novas normas (e elas serão válidas a partir de 1º de janeiro de 2024) vai ser convidado a explicar como o ESG afeta lucro, endividamento, Ebitda, caixa, receita e Capex. Um exemplo prático: uma empresa do agronegócio divulgar suas emissões de gases do efeito estufa é suficiente para um investidor que quer entender a exposição do negócio às mudanças climáticas? Em tese, não: falta, para começo de conversa, entender as despesas com compensação ou as perdas causadas por eventos extremos (secas, chuvas, granizo, geadas etc.). Cifras têm de ser cada vez mais adicionadas aos indicadores ESG. É em resposta a isso que a IFRS S1 (divulgações gerais) e a IFRS S2 (divulgações ligadas ao clima) virão. A conexão entre impacto e resultado nas divulgações corporativas tende a ser positiva para o mercado, que vai se informar sobre sustentabilidade e, assim, tomar melhores decisões de investimento. E também para as empresas: afinal, no longo prazo, elas poderão provar, por meio de seus relatórios, como negócios pautados por premissas ESG são mais funcionais e duradouros.

Normas IFRS S1 e S2 lançadas: os principais tópicos, as novidades – e o que vem por aí

Há algum tempo, fazer a integração real de dois mundos – o da sustentabilidade e o do mercado financeiro – é o grande desafio de reguladores, especialistas e definidores de standards ao redor do mundo. No final de junho, um passo decisivo foi dado nessa direção com o lançamento das Normas IFRS S1 e S2, dedicadas a padrões de divulgação de riscos e oportunidades em sustentabilidade, com foco no mercado de capitais. O lançamento foi durante a IFRS Foundation Conference 2023, realizada em Londres e transmitida para todo o mundo nos dias 26 e 27 de junho. Por meio de nossa unidade de negócios rpt.edu, estivemos na conferência para entender a fundo o que dizem a S1 e a S2. Em resumo, elas prometem dar novo direcionamento à prática de comunicação de resultados, enfatizando o diálogo com os interesses de investidores e a qualificação de discurso e dados sobre riscos e oportunidades atrelados a temas ESG. CIFRAS PARA TODOS OS CAPITAIS Capitaneada globalmente pela IFRS Foundation, por meio do International Sustainability Standards Board (ISSB), a construção das Normas envolveu consultas públicas realizadas em 2022 e a incorporação de vários conceitos e orientações técnicas presentes em documentos da IFRS, incluindo a Estrutura Internacional para Relato Integrado (<IR>) e as Normas SASB. As Normas também recorrem a conceitos e estruturas das diretrizes do Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD) e dialogam com o CDP. A ponte com as Normas da Global Reporting Initiative (GRI), um dos maiores pontos de dúvida, segue em construção. Em sua fala de abertura na Conferência, o chair do ISSB, Emmanuel Faber, foi enfático: as Normas S1 e S2, mais que novas referências para fazer relatórios ou divulgar dados, são um marco na criação de uma linguagem comum no ecossistema global de accounting para assuntos de sustentabilidade, que podem e devem ser traduzidos em termos de negócio e subsidiar decisões de investidores. “A economia não reconhece o valor da natureza para os negócios. Não traduzimos em informação financeira questões com impacto direto sobre elas, como transição populacional, carbono e uso da água. A fronteira que faltava era desenvolver uma linguagem comum e, assim, caminhar para a convergência do relato financeiro e do relato de valor e capitais”, afirmou, fazendo referência à necessidade de dar cifras aos capitais (não apenas o financeiro) acessados e transformados pelos negócios. “Agora, nós atravessamos essa fronteira.” Conhece nossos cursos certificados em Relato Integrado <IR> e GRI? Clique aqui. AS NORMAS EM DETALHE Primeiro bloco de uma série de normas “S” a serem lançadas pela IFRS Foundation – como já ocorre com as Normas IFRS de Relatório Financeiro –, a S1 e a S2 abordam, respectivamente, divulgações sobre sustentabilidade em geral e divulgações relacionadas ao clima. Disponíveis ao público (por enquanto, sem tradução para o português) desde o dia 26 no site da fundação, a S1 e a S2 foram lançadas em oito documentos: as Normas em si, cadernos de orientações setoriais e diretrizes para aplicação, avaliação de efeitos. A S1 é mais abrangente e conceitual: reúne seções de Objetivos, Escopo, Fundamentos Conceituais, Conteúdos Core e Requisitos, entre outras, que destrincham o caminho para empresas desenvolverem seus relatos. Sua construção é diretamente inspirada em conceitos do mercado financeiro: é o caso do de materialidade, que aqui se aproxima das Normas IFRS de Relatório Financeiro e da Estrutura Internacional para Relato Integrado (<IR>), atrelando a definição de temas materiais ao potencial que estes têm de influenciar decisões de stakeholders provedores de capital. A materialidade de impacto, defendida globalmente por normas como as da GRI e focada na percepção de relevância de todos os públicos, é combinável, mas não é o foco. “As Normas IFRS não adotam a dupla materialidade. O foco aqui está no público de investidores”, disse Richard Barker, do ISSB, em uma das sessões da Conferência. As divulgações de sustentabilidade devem ser feitas “in accordance” com as Normas S1 por meio de um processo que inclui o estudo de riscos e oportunidades em sustentabilidade, seguindo instruções do documento, e também a definição de indicadores/dados por meio das Normas SASB – incorporadas, junto com o framework <IR>, pela IFRS Foundation. Além delas, pode-se recorrer a orientações setoriais e outros documentos, como as próprias Normas GRI ou os European Sustainability Reporting Standards. “Torcemos para que os países utilizem as Normas como ponto de partida e adicionem suas necessidades locais. Para nós, isso será um indicativo de sucesso, podemos ser a base e não a única referência”, destacou Sue Lloyd, vice-chair do ISSB, no primeiro dia da Conferência. “A Europa é um exemplo de região que está indo à frente em alguns requisitos. Comunicar nossos standards com adicionais regulatórios locais é o objetivo e finalidade do que fizemos no trabalho do ISSB.” Já as Normas S2 são especificamente dedicadas à divulgação de informação relacionada ao clima. Devem ser adotadas em conjunto com a S1 e estão 100% integradas às diretrizes do TCFD – ou seja, um relatório “in accordance” com as Normas IFRS atenderá aos requisitos daquela Força-Tarefa. O diferencial, segundo Sue Lloyd, é a abordagem da IFRS para um olhar mais focado em cada indústria. “A S2 conta com quatro áreas de conteúdo centrais alinhadas ao TCFD: governança, estratégia, gerenciamento de riscos e métricas e metas. Com elas, queremos que a informação seja apresentada com clareza, alertando investidores sobre riscos e oportunidades climáticos que são materiais para eles, podendo afetar a criação de valor no curto, médio e longo prazos.” A S2 é bastante detalhada: solicita informações de efeitos financeiros de questões ligadas ao clima – riscos físicos e de transição, resiliência climática, análise de cenários futuros etc. – e, embora encoraje abordagens qualitativas, solicita sempre que possível a tradução financeira dos riscos. A parte ligada à mensuração e divulgação de emissões se sintoniza ao GHG Protocol, outra forma de simplificar e criar convergência entre normas e frameworks adotados pelas empresas em sua gestão climática. “Será obrigatório reportar suas emissões de escopo 1, 2 e 3 em linha com os conceitos e métodos do GHG Protocol”, afirmou Caroline Clark-Maxwell, do time técnico que desenvolveu a S2. APLICAÇÃO DAS NORMAS E PERÍODO DE TRANSIÇÃO

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