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O protagonismo da pauta do fogo na COP30 e suas implicações para o setor empresarial

Um dos debates mais relevantes da COP30 em Belém ocorreu fora dos plenários centrais, em um evento dedicado ao tema “O fogo e seus impactos na conservação da biodiversidade no Brasil”. Realizado na Casa Ipê, em parceria entre o IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, Havaianas e a Fundação Sol de Janeiro, o encontro reuniu especialistas e líderes indígenas para discutir um tema que, apesar de crítico para a mudança do clima, só agora ganha o destaque merecido em uma Conferência das Partes. A característica informal do evento, que contou com a presença significativa de brigadistas indígenas entre os painelistas, garantiu uma discussão rica e centrada na realidade de quem está na linha de frente do combate ao fogo. A política de Manejo Integrado do Fogo (MIF) A primeira área de foco do debate foi a política de Manejo Integrado do Fogo (MIF). Esta abordagem reconhece que o fogo é um elemento natural e essencial para a manutenção de muitos ecossistemas brasileiros. O MIF não defende a proibição total do fogo, mas sim a redução de incêndios descontrolados, respeitando o uso consciente e culturalmente necessário que povos e comunidades tradicionais e indígenas fazem desse elemento para suas atividades de subsistência e modos de vida. O entendimento do MIF é crucial para uma política de conservação que seja, ao mesmo tempo, ecológica e socialmente justa. O foco na prevenção e brigadas comunitárias O segundo ponto chave abordado foi a importância do trabalho de prevenção e combate realizado pelos brigadistas, em particular os de comunidades indígenas e tradicionais. Foi ressaltada a necessidade de dois pilares para o sucesso na gestão do fogo: Monitoramento tecnológico: O acompanhamento contínuo de focos de queimada por meio de satélites. Capacitação local: O investimento na capacitação das comunidades que vivem próximas às áreas de risco, garantindo uma resposta rápida e eficaz no combate inicial. Leonardo Gomes (SOS Pantanal) e Tainan Kumaruara (brigadista indígena) enfatizaram que é necessário um investimento prévio em capacitação e equipamentos, em vez de esperar o início do desastre para, então, planejar as ações O exemplo de sucesso no Pantanal A eficácia da prevenção foi ilustrada pelo case das queimadas no Pantanal. Após os grandes incêndios de 2020, a SOS Pantanal mudou sua abordagem. Nos anos seguintes, em vez de depender apenas de ações emergenciais, a organização investiu na capacitação de brigadistas ao longo da estação chuvosa. Em 2024, apesar das previsões de seca indicarem um cenário de queimadas tão graves quanto as de 2020, a região registrou 30% menos áreas queimadas. Este resultado tangível comprova que a prevenção e o investimento em equipes locais e preparadas são o caminho mais estratégico e econômico. O fogo como risco de ESG para empresas brasileiras Para o setor empresarial, o debate sobre a Política de Manejo Integrado do Fogo e o controle de queimadas é uma questão de gestão de riscos ambientais (E) e compliance: Dever de proteção: Empresas dos setores de agropecuária, infraestrutura, construção civil e fabril são legalmente responsáveis pela proteção das Reservas Legais (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APPs) sob seu domínio. Danos causados pelo fogo, mesmo que não intencionais, podem resultar em penalidades ambientais. Inventário de GEE: O carbono liberado pelas queimadas em áreas sob responsabilidade corporativa deve ser obrigatoriamente incluído no inventário de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) da empresa. Transparência e divulgação: A divulgação transparente de dados sobre a proteção de áreas nativas é essencial para relatórios de sustentabilidade e para atender às expectativas de stakeholders. Portanto, a adoção de práticas e instrumentos de controle de queimadas – seja por meio do engajamento em programas de MIF ou pelo investimento direto na capacitação de suas próprias equipes e comunidades vizinhas – não é apenas uma prática de sustentabilidade, mas uma estratégia crucial de mitigação de riscos operacionais, legais e reputacionais. Bruna Duffec, consultora de Sustentabilidade e Clima, membro da comitiva Report na COP30.

Empresas discutem na COP30 transição e adaptação em parceria com comunidades de entorno

Lidar com as mudanças climáticas tanto nos eixos de adaptação, com investimentos em segurança e resiliência, quanto na busca de redução de impacto, descarbonização e inovação social foi um tema constante na COP30 em Belém (PA). Com foco em debater exemplos concretos e caminhos dessa agenda, o diretor-executivo de Estratégia e Clima do Grupo Report, Victor Netto, participou como moderador do painel “Territórios resilientes: justiça climática, comunidades e novos modelos de desenvolvimento”. Organizado na Casa EY, o encontro teve participação representantes do Instituto Votorantim e de empresas como CBA, Citrosuco e Reservas Votorantim. Formação de mão de obra local, entendimento de fragilidades territoriais a eventos extremos ligados à mudança do clima, fomento ao ecoturismo e regeneração, diversificação de fontes de renda. Esses são alguns dos assuntos citados como convergentes na hora de avaliar o que empresas devem fazer junto das comunidades em que estão inseridas, com ganhos mútuos que vãodas cadeias de suprimentos às relações institucionais. “O que está em debate aqui é a integração empresa-território, com uma visão de valor compartilhado que dialogue com o modelo de negócio e adapte os conceitos de resiliência, transição, adaptação à realidade dos negócios e,principalmente, de cada comunidade”, ponderou Netto. O olhar para a cadeia de produtores e fornecedores foi um dos pontos de maior debate, integrando gestão de risco e criação de soluções alinhadas às metas de descarbonização e impacto positivo das empresas. A Citrosuco trouxe comoexemplo seu recém-anunciado programa de apoio a fornecedores não apenas na lida com as mudanças climáticas, mas também na geração de pomares regenerativos. Junto das linhas de crédito especiais, a companhia de citricultura assumiu custos de certificação com seus parceiros e, em parceria com o Itaú BBA, facilita o acesso a crédito e recursos. “Além de ser um caminho de adaptação, o projeto permite a obtenção de recursos com créditos de carbono que são aplicados em projetos regenerativos com a nossa assessoria técnica”, afirmouJullie Lucon, Especialista de Negócios de Carbono da Citrosuco. Mapeando riscos e caminhos de desenvolvimento Entre as iniciativas citadas de adaptação e busca de resiliência diante de eventos extremos, como chuvas intensas, inundações e secas, a CBA, do setor de metalurgia e mineração, relatou ter desenvolvido um índice de vulnerabilidade para os territórios em que a empresa mantém operações. A ideia é entender como cada comunidade está exposta de modo particular àsmudanças do clima e, com isso, definir prioridades e meios de mitigação de riscos que ao fim do dia afetam diretamente os negócios. “Precisamos entender as unidades mais expostas aos riscos climáticos e atuar com os municípios onde estamos presentes, inclusive porque nossosfuncionários e parceiros também estão nesses territórios”, comentou Ligia Carvalho, coordenadora de sustentabilidade da CBA. “Validamos esse entendimento com o conselho da companhia, para nos adaptarmos a eventos extremos com uma priorização coerente de investimentos.” Tatiana Motta, coordenadora de Projetos e Carbono da Reservas Votorantim, ressaltou que o relacionamento com os municípios também deve contribuir com o fortalecimento das vocações de cada região. Deu como exemplo o Legado das Águas, reserva privada de Mata Atlântica mantida pela Reservas Votorantim com 31 mil hectares, entre os municípios de Juquiá, Miracatu e Tapiraí, no Vale do Ribeira, em São Paulo. “Vimos isso na prática: o município precisa se preparar e tornar visíveis seus diferenciais. Então nossa contribuição vai além do aporte de recursos e envolve uma interface forte com municípios e moradores da região para atrair novos empreendimentos e atividades”, diz Tatiana. “Cada município está em um momento, em uma fase. Nosso papel é buscar observar como o clima afeta cada localidade e discutir e apoiar as soluções mais adequadas, sem impor modelos”, reforçou Rodolfo Mota, coordenador doPrograma de Apoio à Gestão Pública do Instituto Votorantim. Guto Lobato, gerente-executivo de educação corporativa, membro da comitiva Report na COP30

Finanças sustentáveis e a transição climática no Brasil: lições de um fórum estratégico

Em um dos eventos paralelos que ocorreram na COP 30 na Casa do Seguro, iniciativa da CNseg, ANBIMA e Febraban, o Fórum de Finanças Sustentáveis reuniu representantes do governo, setor financeiro, seguradoras e organismos multilaterais para debater estratégias para o financiamento da transição climática e o fortalecimento do papel do setor financeiro na construção de uma economia de baixo carbono.   Logo na abertura, a discussão sobre seguro rural foi usada como exemplo de como os efeitos da mudança do clima já pressionam o agronegócio e o planejamento de safra. Foi mencionado que está em desenvolvimento um desenho de seguro rural, com foco em cobrir melhor os riscos climáticos aos quais o setor do agronegócio está exposto e que tendem a se intensificar, reconhecendo o seguro como instrumento central de adaptação, e não apenas de proteção financeira tradicional. Além disso, representantes do governo apresentaram um conjunto de instrumentos recentes em finanças sustentáveis, como as emissões de títulos soberanos verdes, a Taxonomia Sustentável Brasileira, o Eco Invest e a criação da Secretaria Extraordinária do Mercado de Carbono, demonstrando que o Brasil tem avançado de forma significativa na construção de uma infraestrutura financeira mais robusta para acompanhar a transição, tanto do lado regulatório quanto do lado da mobilização de capital privado. Outro tema do debate foi a formação de uma coalizão aberta de mercado de carbono entre Brasil, China e União Europeia, que foi mencionado como relevante por fortalecer o diálogo multilateral diante do cenário geopolítico atual. E, além do fortalecimento do multilateralismo, o mercado de carbono brasileiro demonstra a capacidade e oportunidade do Brasil em dialogar com outros países em pé de igualdade, considerando sistemas de monitoramento, relato e verificação, contabilidade de carbono em nível de produto e mecanismos de ajustes de fronteira, como o CBAM. Nas discussões sobre o Plano de Transformação Ecológica e como o setor financeiro tem contribuído, o foco foi reconhecer os avanços recentes, mas deixando claro que tem diversas lacunas que precisam ser fechadas para os projetos seguirem bem, sobretudo encontrando soluções em conjunto. Nesse sentido, destacaram que existem projetos de interesse nacional, mas que ainda não avançaram pela necessidade de avançar em seguros e contratos de off-take, assim como capital catalítico para atrair os investidores e financiadores e atender a lógica de risco-retorno desses públicos. Com isso, o “espírito de mutirão” citado pelo Dan Ioschpe ao longo da COP 30 se encaixa perfeitamente, tendo em vista a necessidade de considerar cada elo da cadeia de valor para o sucesso da agenda, incluindo financiamento, seguro, cadeia produtiva e infraestrutura, de uma forma estruturada e organizada para ser eficiente e destravar a implementação. Ao abordar os motivos que ainda limitam a atração de capital, lembrou-se que o desenvolvimento socioeconômico brasileiro historicamente não incorporou plenamente a sustentabilidade, apesar do país ter um bônus competitivo em recursos naturais e potencial de descarbonização. Diante disso, foi levantado que o Brasil ainda precisa transformar seu potencial em carteira estruturada de projetos, com governança, modelagem financeira adequada e mecanismos de mitigação de risco. Assim, a COP 30 é vista como um grande chamado para implementação, considerando a lógica de que, se houver bons projetos e capacidade de entrega, os recursos tendem a aparecer. Já nas discussões sobre florestas e bioeconomia, o foco naturalmente voltou-se para a Amazônia, reforçando a ideia de que os instrumentos financeiros devem reconhecer o valor da floresta em pé, tanto como infraestrutura verde quanto ativo para resiliência e adaptação climática. Com isso, o TFFF foi mencionado como um dos grandes anúncios da COP30 justamente por romper com a lógica tradicional de doação e se estruturar como um mecanismo de investimento. Em relação às áreas públicas, o representante do Serviço Florestal Brasileiro destacou que existem programas de manejo florestal nas terras públicas federais que podem ser importantes para fornecer a madeira que o mercado demanda, sendo uma das soluções para gerar renda de forma legal, gerando empregos e reduzindo a pressão sobre áreas irregulares. Contudo, permanece a lacuna de seguros específicos para projetos de restauração em larga escala, o que limita a expansão de algumas iniciativas. Já na esfera privada, a bioeconomia é vista como o caminho para gerar renda a partir da floresta, especialmente por meio de cadeias de óleos, frutos e sementes amazônicas. No entanto, a dúvida que parece permanecer entre os investidores é em relação à existência de garantias adequadas para proteger esses projetos de eventos climáticos ou outras perturbações externas. Sem instrumentos apropriados de seguro e financiamento, o risco continua maior para quem tenta atuar de forma sustentável. Ao longo das discussões, foram mencionadas iniciativas que buscam ampliar o acesso a garantias para comunidades que vivem na floresta. Apesar dos avanços, o tema não foi central no debate, evidenciando que ainda há um caminho para amadurecer essa agenda e assegurar que os recursos cheguem justamente a quem mantém a floresta em pé. Tainara Sobrero consultora de sustentabilidade e estratégia, integrante da comitiva Report na COP30

Colaboração e coalizões para um futuro sustentável

Diante dos desafios globais que enfrentamos da crise climática às desigualdades sociais e considerando que a COP 30 vendo sendo reconhecida como a COP da implementação, torna-se cada vez mais evidente que nenhuma organização, governo ou indivíduo conseguirá avançar sozinho. O mundo exige colaboração, capacidade de escuta e a construção de coalizões fortes, capazes de alinhar visões, recursos e competências diversas em torno de um propósito comum. Construir um futuro melhor depende de reconhecermos que as soluções não estão em uma única mesa, mas na soma de múltiplas perspectivas. É na interseção entre setores, países, governos, culturas, saberes e experiências que surgem as respostas mais inovadoras e eficazes. Por isso, cada parceria é mais que uma união de esforços: é um convite para pensar diferente, criar junto e agir com mais impacto. Coalizões não são apenas alianças formais, são espaços de responsabilidade compartilhada. São ambientes de alinhamento antes da ação, onde divergências viram aprendizado e onde o compromisso coletivo permite avançar muito além do que qualquer iniciativa isolada. Abaixo estão listadas coalizões e colaborações que já apareceram na primeira semana de COP 30. Colaboração espacial para combate ao desmatamentoEspecialistas de agências espaciais internacionais participaram de uma mesa-redonda na Casa da Ciência, em Belém, discutindo a criação de uma coalizão espacial para monitoramento e combate ao desmatamento. Representantes de Austrália, Reino Unido e Gabão reforçaram a importância da cooperação científica internacional diante da velocidade das mudanças climáticas. Como disse Aboubakar Mambimba, diretor-geral da Agência Gabonesa para Estudos e Observações Espaciais: “Precisamos unir pessoas capacitadas para manter de pé nossas florestas, independentemente do país.” Coalizão Brasil Clima, Florestas e AgriculturaA coalizão lançou a publicação “Propostas para uma Transição Climática Global para o Setor do Uso da Terra”, apresentando dez medidas estruturadas nos três pilares da Agenda de Ação da COP 30. Reunindo mais de 400 representantes do agronegócio, setor financeiro, sociedade civil e academia, a Coalizão demonstra que é possível integrar competitividade agrícola, conservação ambiental, responsabilidade climática e inclusão social. Cooperação global para redução de metanoO Ministério da Agricultura e Pecuária, Embrapa Suínos e Aves e o Instituto 17 apresentaram um guia inédito com práticas, tecnologias e recomendações para orientar políticas públicas e estratégias nacionais de redução de metano. A iniciativa foi destacada como passo importante para fortalecer a cooperação técnica entre países. Capitals CoalitionCom ambição para 2035, a coligação busca incorporar o valor de todos os capitais — natural, social, humano e produzido — nas decisões financeiras e empresariais. O trabalho envolve a colaboração com contadores, reguladores e tomadores de decisão para construir confiança e credibilidade na integração dos capitais como base operacional de mercados e políticas. Coalizão Aberta de Mercados Regulados de CarbonoUma iniciativa colaborativa voltada à troca de experiências sobre precificação de carbono, sistemas de MRV (Monitoramento, Reporte e Verificação), metodologias de contabilidade e regras para uso de créditos de alta integridade. Seu objetivo é fortalecer a ambição, efetividade e equidade dos mercados regulados de carbono como instrumentos essenciais para o cumprimento das NDCs no âmbito do Acordo de Paris. A declaração já foi endossada por Brasil, China, União Europeia, Reino Unido, Canadá, Chile, Alemanha, México, Armênia, Zâmbia, França e Ruanda e permanece aberta a novas adesões. O papel do setor empresarial Mobilizar o setor empresarial em ações coletivas, projetos e capacitações de mitigação e adaptação climática é fundamental para catalisar a integração da agenda climática nas estratégias corporativas, acelerando a transição do Brasil para uma economia resiliente e net-zero, de forma transparente, justa e inclusiva.   Mensagem da Presidência da COP 30, na nona carta “Embora a janela de oportunidade esteja se estreitando, manter vivo o objetivo de 1,5 °C ainda é possível — desde que a cooperação internacional seja direcionada para catalisar círculos virtuosos de transformação acelerada. Este é o momento de transformar o risco de pontos de inflexão planetários em oportunidade para uma guinada global.” Na COP 30, a resposta coletiva à urgência climática precisa se materializar por meio da implementação acelerada, da solidariedade e da cooperação internacional. Rachel AlvesGerente executiva de consultoria, integrante da Comitiva Report na COP30 

Portfólio de investimentos sustentáveis e governança territorial ganham foco na COP30

O auditório Jandaíra da Green Zone da COP30 reuniu ministros de estado, membros do governo federal e da sociedade civil, lideranças da Itaipu Binacional, o ministro Guilherme Boulos, da Secretaria Geral da Presidência, e Janja Lula da Silva, Embaixadora dos ODS e Enviada Especial para Mulheres da COP. Em duas sessões temáticas, foram abordados a relação entre a governança participativa e a Agenda 2030 das Nações Unidas, e os investimentos federais em transformações ecológicas. Os laços entre as agendas social e ambiental foram evidenciados nos debates. Em meio a compromissos e dados de projetos de investimento sustentável governamentais, pautas delicadas, como a exploração na foz do Amazonas e o pagamento por serviços ambientais, renderam posicionamentos da sociedade civil e do governo. Agenda 2030 com foco na governança participativa O primeiro debate contou com a participação da Itaipu Binacional, que apresentou exemplos de programas de desenvolvimento territorial. O ministro Guilherme Boulos e Janja Lula da Silva escutaram ponderações sobre as expectativas de movimentos sociais e empresas para o exercício prático de fiscalização, acompanhamento e envolvimento da sociedade quanto à contribuição brasileira à Agenda 2030. “Em um contexto de crise climática, social e econômica, a governança participativa é o elo entre política pública e vida comunitária”, disse Enio Verri, diretor geral da Itaipu. Suhellen Iurk Preste, do Instituto SustentAção, ressaltou como mecanismos de participação e governança social são uma forma de combater a crise de representação vivida pelas instituições e estabelecer uma gestão democrática e horizontal. “Os espaços de participação social precisam ser uma prioridade para o governo”, afirmou. As indagações do público foram sintetizadas em uma lista objetiva de demandas ao governo. Especificamente quanto a dois temas críticos — assegurar pagamentos aos serviços de catadores e associações nas cidades e reavaliar a exploração de petróleo na foz do Amazonas, recentemente autorizada pelo governo federal —, Janja se comprometeu com a remuneração pela União à cadeia de reciclagem, em caso de impossibilidade dos municípios e estados. Também indicou que há critérios e diretrizes para um eventual processo de exploração de petróleo no Amazonas. “Convido a verem o que a ministra Marina (Silva) já declarou sobre o tema. É preciso entender que há um mapa para reduzir a dependência do Brasil quanto aos combustíveis fósseis, e uma fiscalização rigorosa garantida para novos projetos. A transição energética não vai ocorrer no dia seguinte ao fim da COP, e para isso temos que manter um plano de transição.”   Portfólio de investimentos sustentáveis: dados e taxonomia brasileira Na segunda parte da agenda, representantes do Ministério da Fazenda e integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social e Sustentável apresentaram o Portfólio de Investimentos Sustentáveis no Brasil, um mapeamento de centenas de iniciativas em energia, indústria, infraestrutura e bioeconomia em andamento no país. Os dados, disponíveis na plataforma do Ministério da Fazenda, se alinham à taxonomia sustentável brasileira. São mais de 2,5 mil projetos públicos e privados, distribuídos em 832 cidades brasileiras, somando R$473 bilhões em investimentos. Os dados evidenciam:   Região Volume de Investimentos Nordeste R$ 241 bilhões Norte R$ 29 bilhões Centro-Oeste R$ 21 bilhões “À medida que a taxonomia for utilizada teremos um mapeamento mais e mais completo de todos os projetos em andamento ou em captação de recursos. São oportunidades para atrair e listar investimentos públicos e privados em iniciativas nas frentes que dialogam com a transição e a adaptação às mudanças climáticas”, disse Cristina Reis, titular da Secretaria Extraordinária do Mercado de Carbono do Ministério da Fazenda, que esteve à frente das negociações do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Laura Carvalho, diretora da Open Society e integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social e Sustentável, relacionou os recursos para lidar com a crise climática à competitividade do País e à descarbonização e transição energética. “Esse portfólio ilustra a associação de investimentos a critérios de impacto, posicionando o Brasil como líder global da economia verde.” Guto Lobato Gerente-executivo de educação corporativa, integrante da Comitiva Report na COP30.

Adaptação climática: ciência, planejamento e financiamento no centro da pauta

A COP30 começou com um olhar atento à adaptação climática nas cidades brasileiras. No painel “Implementando Ações de Adaptação”, realizado na Green Zone, representantes do governo federal discutiram como ciência, planejamento urbano e financiamento público podem se unir para que a adaptação aconteça de forma efetiva nos territórios. Participaram o ministro das Cidades, Jader Filho, a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, e a vice-presidente de Habitação da Caixa Econômica Federal, Inês Magalhães.O debate destacou a urgência de fortalecer políticas públicas baseadas em dados e integrar diferentes áreas do conhecimento para prevenir riscos e promover soluções sustentáveis. Entre os anúncios, o ministro apresentou o novo sistema SINIDU CLIMA, criado em parceria com o MCTI, que reunirá informações científicas e projeções climáticas para orientar decisões de investimento em projetos de adaptação. Também foi lançada uma linha de apoio financeiro voltada a municípios de pequeno e médio porte, em parceria com a Caixa, com o objetivo de viabilizar obras de prevenção e fortalecer a elaboração de projetos locais. Inês Magalhães lembrou que 85% da população brasileira vive em áreas urbanas, reforçando que a crise climática será enfrentada principalmente nas cidades. Já a ministra Luciana Santos ressaltou que metade dos municípios do país tem áreas de alto risco e destacou a importância de integrar dados científicos e planejamento urbano para reduzir vulnerabilidades. Durante o painel, foram citadas plataformas e instituições fundamentais para o monitoramento de riscos e apoio à gestão pública, como Adapta Brasil, Cemaden e Inpe.Entre os pontos centrais discutidos, estiveram a necessidade de decisões baseadas em ciência, o apoio técnico e financeiro aos municípios e a importância da integração entre governo, ciência e sociedade. As discussões reforçam que a adaptação climática não é apenas uma pauta ambiental, mas uma questão estratégica de desenvolvimento e competitividade. Assim como os governos, as empresas também precisam compreender seus riscos climáticos — físicos e de transição — e se preparar para eles. Na Report, buscamos aliar ciência e visão de negócio para apoiar organizações na identificação de riscos, oportunidades e ações de adaptação que contribuam para um futuro mais resiliente. Sabrina FagundesGerente de negócios em estratégia e clima – Grupo ReportIntegrante da Comitiva Report na COP30

COP30 em Belém: financiamento climático e o papel do Brasil na transição global

Financiamento climático: o que esperar da COP 30

A COP 30 deve marcar uma inflexão no debate climático: menos centrada na formulação de compromissos globais (mesmo que os países ainda tenham que apresentar suas NDCs) e mais voltada à criação de condições financeiras para viabilizá-los. A mitigação e a adaptação não avançarão sem um redesenho profundo dos mecanismos de financiamento — e, em 2025, o tema se torna o cerne das negociações multilaterais. Uma das iniciativas mais esperadas para essa edição da COP é o “Roteiro de Baku a Belém”, que busca construir caminhos para a mobilização de US$1,3 trilhão até 2035 em financiamento climático, voltado para os países em desenvolvimento. A ideia é redesenhar a arquitetura financeira global e atrair recursos para a adaptação desses países, que hoje lidam com barreiras significativas de atração de capital privado, endividamento e restrições fiscais. Entre os obstáculos mais críticos estão a ausência de consenso entre países desenvolvidos e em desenvolvimento e a dificuldade de financiar projetos de longo prazo em energia limpa, agricultura regenerativa, adaptação climática e infraestrutura resiliente. Além disso,   os mercados emergentes estão mais expostos a riscos de crédito e volatilidade cambial. O plano brasileiro O Brasil tem buscado estruturar uma agenda financeira e regulatória que responda a esse desafio. O Plano de Transformação Ecológica – Novo Brasil, lançado pelo Ministério da Fazenda, constitui o arcabouço mais abrangente já apresentado no país para integrar crescimento econômico, transição climática e inclusão social.  No final de agosto, o governo brasileiro disponibilizou um Painel de Monitoramento do plano, que completou dois anos em 2025 e está organizado em torno de quatro grandes eixos:  Finanças sustentáveis Sustentabilidade ambiental Empregos e transição justa Inovação tecnológica e reindustrialização verde Dentro do eixo de finanças, destacam-se instrumentos como o Fundo Clima, o programa Eco Invest Brasil, a emissão de títulos soberanos verdes e a preparação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE). Outra aliada de peso é a Taxonomia Sustentável Brasileira, cujos cadernos técnicos foram recentemente aprovados, estabelecendo critérios para classificar atividades econômicas de acordo com seus impactos socioambientais e climáticos. Os documentos estão em processo de revisão final para publicação em breve, em portugues e inglês. Em seguida, serão trabalhados pelos respectivos órgãos reguladores. Financiamento climático: escala e barreiras No campo do financiamento climático, iniciativas como o Eco Invest Brasil, desenvolvido em parceria entre o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o governo brasileiro, buscam mitigar riscos cambiais e atrair capital privado estrangeiro para projetos de longo prazo — de energia renovável a soluções baseadas na natureza. Entre elas estão  mecanismos de blended finance, que combinam recursos públicos, privados e filantrópicos para reduzir riscos de investimento, e que começam a ganhar espaço como instrumentos de escala. O relatório do CPI/PUC-Rio revelou um salto significativo nos fluxos de financiamento climático internacional para o Brasil entre 2021–2022, com crescimento de 84% em relação ao biênio anterior, atingindo cerca de R$ 26,6 bilhões por ano — uma taxa muito superior ao aumento global, que foi de 28% no mesmo período. O crescimento foi liderado pelo setor de energia limpa, que obteve aumento de 165% nos recursos destinados à geração solar e eólica. Ainda assim, a assimetria setorial é evidente: a energia responde por 53% dos recursos, enquanto o setor de uso da terra (AFOLU), que representa a maior parcela de emissões nacionais, recebe apenas 11%. Projetos florestais, apesar de estratégicos para o cumprimento das NDCs brasileiras, captam somente 2% do total, embora representem 41% das doações internacionais. Essa lacuna sinaliza tanto a urgência quanto a oportunidade de reequilibrar os fluxos de capital para soluções baseadas na natureza. O potencial das florestas Por isso, também é esperado com entusiasmo para a COP 30 o anúncio do Fundo de Florestas Tropicais (TFFF), um novo modelo de financiamento climático que recompensa os países que preservam suas florestas tropicais. A expectativa é de captar US$125 bilhões, em uma operação que independe do mercado de carbono regulado. O fundo faz parte de uma estratégia mais ampla do governo brasileiro que inclui outros pilares como a sociobioeconomia e a biotecnologia.  A Climate Advisers Initiative, por meio de seu relatório Orbitas, aposta que, nos próximos 30 anos, a restauração florestal em larga escala de pastagens degradadas no Brasil pode gerar até US$ 141 bilhões em valor, criando mais de 350.000 empregos em tempo integral anualmente. Ainda de acordo com a iniciativa, “sob as condições certas, as florestas e a biodiversidade podem ser restauradas em quase 60 milhões de hectares (Mha) — uma área do tamanho da França”. E ainda ressalta que “esses resultados estão ao nosso alcance, mas somente se os setores público e privado do Brasil agirem rapidamente”. Impactos para as empresas A sétima carta da presidência da COP 30 foi direcionada às empresas e ao setor privado, reconhecendo os avanços significativos na transição, mas destacando a necessidade de acelerar o engajamento por meio da Agenda de Ação Climática, que destaca seis eixos temáticos e trinta objetivos-chave. “A expectativa da liderança da COP 30 é de que haja uma abordagem mais concreta sobre qual financiamento será necessário para cada tipo de solução climática. A qualidade das NDCs está melhorando e, com isso, direcionando a operação do setor privado em um ambiente mais controlado e seguro”, ressalta Tainara Sobreiro, especialista em finanças sustentáveis no Grupo Report.  Com isso, o foco do governo nas empresas estará apoiado  em três pilares: alavancar a inovação, atrair capital para a transição e influenciar o engajamento da cadeia produtiva. Com essas soluções e o avanço do debate na COP, o setor privado passaria a operar em um ambiente em que regulação, finanças e estratégia corporativa estarão cada vez mais interdependentes. O desafio será navegar as incertezas, compreender os novos mecanismos financeiros e transformar riscos climáticos em oportunidades de negócio. Ao unir visão técnica, experiência em relato e compreensão das dinâmicas financeiras, a Report ajuda organizações a avançar de forma segura em um cenário de maior escrutínio e novas exigências de transparência. Oferecemos estratégias de descarbonização, mapeamento e valoração de riscos e oportunidades, planos de adaptação climática

Relato ESRS: estudo de caso CRONIMET com apoio da Report

Relato ESRS: aprendizados e avanços no segundo ciclo da CRONIMET

Empresa antecipa exigências da União Europeia e consolida o relato como ferramenta estratégica A CRONIMET, multinacional alemã especializada na reciclagem de metais, publicou seu segundo relatório de sustentabilidade com referência aos European Sustainability Reporting Standards (ESRS). A decisão de fazer a transição voluntária para os critérios da União Europeia, mesmo sem obrigação legal em 2024, reflete uma visão estratégica de longo prazo: transformar o relato em ferramenta de gestão, antecipando exigências regulatórias e estruturando sua jornada rumo à descarbonização. “Para nós, o relato é mais do que uma obrigação formal — é uma ferramenta estratégica para desenvolver a empresa de forma sustentável e preparada para o futuro.” — Annette Gartner, CIO/CHRO da Cronimet O contexto, no entanto, é desafiador. De um lado, as regras da CSRD estão em revisão — em 2025, a Comissão Europeia anunciou um pacote de ajustes legislativos conhecido como Omnibus, com o objetivo de simplificar os processos e reduzir os custos de implementação dos ESRS. De outro, empresas que se antecipam ao marco regulatório enfrentam o desafio de aplicar padrões em constante evolução, ainda com escassa maturidade de mercado. Nesse cenário, o segundo ciclo de relato da CRONIMET apoiado pelo Grupo Report serviu como um verdadeiro laboratório. A companhia se aprofundou na análise de dupla materialidade, consolidou metas climáticas com validação da SBTi e aprimorou a estrutura de comunicação dos resultados — com destaque para a seção “In Brief”, desenvolvida com apoio da Report, com  aplicação para diferentes públicos. A Report atuou como parceira técnica ao longo de todo o processo, auxiliando na superação de lacunas de dados e adaptando metodologias à lógica dos ESRS. Mais do que um exercício de relato, o projeto exigiu leitura crítica da norma, escuta ativa e flexibilidade para adaptar o cronograma às necessidades emergentes da organização. Um aprendizado mútuo que reforça a capacidade técnica da Report em projetos regulados por marcos internacionais. A CRONIMET seguirá trabalhando internamente para reduzir lacunas no relato e se preparar para o próximo ciclo. Independentemente do escopo futuro, a experiência acumulada pavimenta o caminho para uma jornada mais estratégica e eficiente — e a Report segue pronta para apoiá-la. Estudo de caso: CRONIMET Avanços   Aplicação estruturada da análise de dupla materialidade, com maior envolvimento das áreas internas; Definição de metas de redução de emissões com validação da SBTi, alinhadas ao Acordo de Paris; Criação da seção “In Brief”, facilitando o uso do relatório em diferentes contextos de comunicação; Adoção crescente da lógica dos ESRS pela equipe da Report e do cliente, com maior maturidade técnica ao longo do projeto. Desafios Necessidade de soluções internas para preencher lacunas de dados; Revisão de etapas do cronograma para atender à lógica de ciclos e validações dos ESRS; Preparação do sistema de coleta de dados para a inserção de indicadores ESRS na Central ESG® e adaptação do projeto de design. Lições aprendidas A transposição direta de práticas do GRI não funciona nos ESRS: nova abordagem é indispensável; Persistem dúvidas sobre o que realmente deve ser reportado de acordo com a da norma, reforçando o papel da assessoria técnica; Separar os entregáveis por finalidade (compliance, gestão, comunicação) pode melhorar a eficácia; Projetos sob nova regulação exigem governança sólida e escopo bem delimitado desde o início.

Entrevista com especialista da Report sobre o uso estratégico da materialidade na gestão de riscos e na resposta a frameworks como IFRS e ESRS.

Como transformar a materialidade em ferramenta de gestão e estratégia

A materialidade deixou de ser um exercício isolado e passou a ocupar um espaço central na gestão de riscos, na formulação da estratégia e na resposta aos frameworks regulatórios mais exigentes. Quem fala isso não é apenas uma consultoria especializada em sustentabilidade, mas os investidores e os reguladores.  Hoje, mais do que mapear temas relevantes, as empresas precisam entender a dimensão dos riscos que enfrentam, os impactos que geram e como esses fatores influenciam — ou vão influenciar — a sustentabilidade do negócio. Para aprofundar esse tema, convidamos Veridyana Borges, especialista da Report que lidera a evolução metodológica dos projetos de materialidade da consultoria. Nesta entrevista, ela compartilha uma visão direta e técnica sobre os pilares de uma boa materialidade, o papel da dupla abordagem, o engajamento da liderança e os diferenciais que têm orientado a atuação da Report nessa frente. A seguir, a conversa completa. 1. O que define, na prática, uma materialidade bem feita? Na minha visão, uma materialidade bem feita tem dois pilares principais. O primeiro é um bloco de gestão de riscos realmente estruturado, e o segundo é o envolvimento efetivo da alta liderança no processo. Quando falo em gestão de riscos, não estou me referindo a um mapeamento pontual para cumprir um processo de relato. É algo que precisa estar conectado ao sistema corporativo de gestão de riscos da empresa. Ou seja, o que a gente levanta na materialidade — especialmente no eixo financeiro — precisa ser incorporado depois pela companhia, virar insumo para monitoramento, para aprofundamento, para tomada de decisão. Hoje, com os frameworks como o IFRS/ISSB e o ESRS, não basta levantar riscos de forma genérica. A empresa precisa estimar a magnitude desses riscos, muitas vezes em valores financeiros, e classificar por criticidade. A gente já entrega isso nos nossos projetos — uma estimativa de impacto financeiro que ajuda a empresa a priorizar o que precisa ser aprofundado depois com análise de cenários e valoração completa. Se essa etapa for feita de maneira superficial, compromete a seguinte. E o segundo pilar, que é o engajamento da liderança, é o que vai garantir que a materialidade cumpra a sua função na estratégia do negócio. Se a alta liderança não participa, se não entende o que está sendo feito, o processo perde força. Vira conteúdo para o relatório, mas não vira direcionador de negócio. Quando a liderança se envolve, entende os riscos, participa da priorização, o projeto ganha legitimidade — e tem muito mais chance de virar gestão de fato. 2. Como a dupla materialidade se insere nesse processo? A dupla materialidade é um diferencial, uma boa prática — mesmo que o framework adotado não exija formalmente essa abordagem. Ela amplia a visão da empresa, porque combina o que pode impactar o negócio (risco financeiro) com aquilo que a empresa impacta no mundo (socioambiental). E essas duas coisas estão totalmente conectadas. O que é impacto hoje em algum momento se tornará risco financeiro. A GRI pede para a empresa detalhar os impactos, mas parte do princípio de que tudo, no fim, pode virar risco. Já o IFRS fala dos impactos como conceito, mas exige mesmo que você relate os riscos e sua gestão. O ESRS é o único que exige os dois formalmente — impactos e riscos — justamente porque entende essa interdependência. A verdade é que, mesmo que a empresa esteja usando IFRS ou GRI, se fizer só metade do caminho, corre o risco de não ver a imagem completa. A dupla materialidade entrega essa visão mais sistêmica, mais realista sobre como a empresa se relaciona com o ecossistema em que está inserida. E isso tem tudo a ver com estratégia. 3. E qual é o papel dos stakeholders e da cadeia de valor nesse contexto? Esses são dois aspectos que às vezes são tratados como acessórios, mas que são fundamentais. O engajamento de stakeholders — feito de forma qualificada — traz uma visão muito mais ampla sobre os riscos e os impactos que a empresa pode estar subestimando. Ao ouvir stakeholders externos, a empresa enxerga temas que não estavam mapeados internamente. Isso ajuda tanto na análise de impacto quanto na identificação de riscos reputacionais, regulatórios, sociais… que são super relevantes do ponto de vista da gestão. A cadeia de valor também é um ponto crítico. Uma materialidade bem feita precisa considerar não só os impactos diretos da operação, mas também o que acontece em toda a cadeia. Isso exige um olhar mais atento e, muitas vezes, metodologias que permitam capturar esses efeitos no curto, médio e longo prazos mesmo em elos mais distantes. É mais trabalhoso, mas essencial para uma análise completa. 4. Como a Report tem se preparado para responder a essas exigências? Já trabalhamos com materialidade desde a GRI colocou esse princípio no centro do processo de relato. Mas a Report vem aprofundando sua metodologia de forma contínua, justamente por causa da chegada de novos frameworks e da mudança de expectativa sobre o que é uma boa materialidade, um bom processo de materialidade. Hoje, temos um núcleo técnico que nasceu dentro da frente de finanças sustentáveis e que está totalmente dedicado ao estudo de valoração de riscos. Esse grupo tem feito um trabalho muito aprofundado, estudando metodologias, participando de formações com especialistas de mercado e testando abordagens que tragam mais precisão para a estimativa de impacto financeiro. Além disso, investimos na parte tecnológica. Estamos evoluindo o uso de sistemas e plataformas para apoiar tanto a análise quanto a gestão do conhecimento — nosso e dos clientes. Isso ajuda a dar mais consistência, repetibilidade e qualidade para os projetos. 5. E quais você diria que são os diferenciais da Report nesse campo? Eu destacaria alguns pontos. Primeiro, a robustez metodológica. A gente trabalha com uma régua clara para avaliar riscos, com critérios objetivos, inclusive financeiros. Isso dá mais segurança para os clientes e ajuda a priorizar com base em dados. Segundo, a gente facilita o caminho para a integração da materialidade à gestão de riscos. Não é uma entrega isolada. O

Proposta da EFRAG simplifica os ESRS e reduz requisitos de reporte

ESRS: o que muda com a proposta de simplificação da EFRAG

Reduções expressivas, reestruturação metodológica e maior alinhamento com padrões internacionais marcam a nova versão dos ESRS apresentada em julho. Por Bárbara Virgili da Costa e Carolina Blois, consultoras em sustentabilidade na Report Em maio de 2025, a Comissão Europeia emitiu à EFRAG um mandato oficial para revisar e simplificar os European Sustainability Reporting Standards (ESRS). A solicitação partiu do reconhecimento de que as normas, ainda que robustas, exigem ajustes para refletir a diversidade de maturidade das empresas frente à agenda de sustentabilidade. Desde então, uma série de reuniões técnicas e públicas culminou na versão 1.6 dos Draft Amended ESRS, apresentada ao longo de julho. O Grupo Report acompanhou de perto esse processo e resume, a seguir, os principais destaques. Seis eixos da proposta de revisão Simplificação da avaliação de dupla materialidade (DMA); Maior legibilidade e concisão das declarações de sustentabilidade, com melhor integração ao relatório corporativo; Revisão crítica da relação entre os Requisitos Mínimos de Divulgação (MDRs, agora GDRs) e os tópicos temáticos; Melhoria da clareza e acessibilidade do texto normativo; Introdução de medidas de alívio para redução da carga de reporte; Maior interoperabilidade com frameworks internacionais, como o ISSB. Quais reduções já foram feitas? As mudanças anunciadas até aqui já representam um corte relevante nos requisitos de reporte: 58% de redução nos data points obrigatórios (“shall”) 97% de redução nos voluntários (“may”) 26% dos MDRs (agora GDRs) eliminados A proposta não apenas alivia a carga de trabalho das empresas, mas reafirma a lógica de proporcionalidade e materialidade: o foco deve estar no que realmente importa. Normas gerais (ESRS 1 e ESRS 2): estrutura, materialidade e flexibilidade ESRS 1 – Requisitos gerais As mudanças estruturais no ESRS 1 fortalecem a aplicabilidade prática: Os comandos “shall” agora são apresentados como data points separados; As orientações obrigatórias passam a integrar diretamente os itens de divulgação (como os Application Requirements); Os conteúdos não obrigatórios foram transferidos para guias ilustrativos (NMIGs-Non-Mandatory Illustrative Guidance); Introdução do conceito “gross versus net”, que diferencia impactos brutos e líquidos na avaliação de materialidade; Substituição do termo “matter” por “topic” ou “subtopic”.  De forma geral, as empresas passam a contar com mais autonomia para definir o nível de reporte, de acordo com seu contexto e maturidade, bem como uma cobertura proporcional da cadeia de valor e definições mais claras sobre as fronteiras de reporte. Dupla materialidade e fair presentation A nova seção “considerações práticas” reforça a aplicação proporcional da dupla materialidade; A materialidade da informação é reconhecida como filtro central da declaração de sustentabilidade; O conceito de fair presentation (apresentação fiel), oriundo do ISSB, passa a ser incorporado, com foco em relevância e representação verdadeira — tema que gerou debate quanto à maturidade das empresas europeias para aplicá-lo com o mesmo rigor dos relatórios financeiros.  ESRS 2 – Governança, estratégia e modelo de negócios GOV-4 (antigo GOV-5): reduz a granularidade dos relatos narrativos e reforça a compatibilidade com o IFRS S1/S2; SBM-3: duas opções foram apresentadas e serão decididas na consulta pública: Dados financeiros quantitativos obrigatórios, com possibilidade de justificativa e uso de qualitativos; Informações qualitativas obrigatórias e quantitativas opcionais. GDRs substituem MDRs Os novos GDRs só são exigidos se a empresa tiver políticas, metas ou ações sobre o tema — uma mudança importante que respeita o princípio da aderência à realidade. Normas ambientais (ESRS E1 a E5): cortes, clareza e convergência A reunião de 16/07 marcou a apresentação oficial das propostas de simplificação para os padrões ambientais. Abaixo, os principais pontos: Objetivos da revisão ambiental: Redução de requisitos narrativos e métricos em IRO-1, SBM-3 e PATs; Clareza nos indicadores quantitativos (nível 4); Eliminação de redundâncias e aumento da compatibilidade com IFRS. ESRS E1 – Mudança Climática Item Ajuste E1-1 (Plano de Transição) Condensação narrativa e foco em compatibilidade com o cenário de 1,5°C E1-2 (Riscos Climáticos) Incorporação do IRO-1 com categorização temporal simplificada E1-3 (Resiliência) Alinhamento com IFRS S2 e destaque para avaliação quantitativa E1-4 e E1-5 (Políticas e Ações) Evita sobreposição com ESRS 2; adaptação climática realocada E1-6 (Metas) Retira a exigência de “net zero”; amplia flexibilidade para metas por intensidade E1-7 (Energia) Elimina intensidade energética por receita líquida E1-8 (Emissões GEE) Intensidade torna-se voluntária; escopos 1, 2 e 3 permanecem obrigatórios E1-9 (Créditos de Carbono) Exige detalhamento, mas sem vínculo com metas net zero E1-10 (Preço Interno de Carbono) Informações mínimas sobre uso e definição do preço E1-11 (Impactos Financeiros) Redução da complexidade narrativa Reduções no E1: “Shall”: -53% (84 de 196) “May”: -87% (13 de 15) ESRS E2 – Poluição Eliminação do IRO-1 e do E2-6; E2-4 passa a exigir relato sobre microplásticos e emissões atmosféricas sem depender do E-PRTR; Discussões importantes sobre: A ambiguidade no parágrafo AR 4.16(a), que trata de poluentes na cadeia de valor; A ausência de uma lista exemplificativa de poluentes reportáveis; E2-5 diferencia fabricantes de químicos e usuários finais, com base no regulamento REACH. ESRS E3 – Água Restrição a água doce (recursos marinhos fora do escopo direto); E3-4 torna obrigatória a caracterização do balanço hídrico em áreas críticas (de “may” para “shall”); Debate aberto: o balanço hídrico deve incluir a cadeia de valor? ESRS E4 – Biodiversidade e Ecossistemas E4-1 exige plano de transição em conformidade com o Kunming-Montreal Global Biodiversity Framework; E4-5 solicita identificação apenas dos sites mais relevantes, dispensando relato universal. ESRS E5 – Recursos e Economia Circular E5-4 introduz os “materiais-chave” e faz referência ao Critical Raw Material Act; E5-5 flexibiliza métricas de reciclabilidade e descarte, com destaque para reuso e segmentação por tipo de resíduo. Reduções entre E2 e E5: “Shall”: -67% (89 de 170) “May”: -100% Normas sociais (S1 a S4) e governança (G1): foco em princípios e coerência A simplificação dos padrões sociais reflete um movimento mais profundo: redução de volume, eliminação de repetições e adoção de abordagens baseadas em princípios. Diretrizes gerais da revisão social Redução da complexidade da avaliação de dupla materialidade Convergência com o relatório corporativo Reavaliação crítica dos requisitos mínimos Clareza textual Dispensas com base em ônus excessivo Padrão Total original Deletados Redução S1 – Força de trabalho

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